Recebi esses dias uma mensagem de uma cliente — fofa, educadíssima, direta ao ponto — perguntando: “o vestido tem forro?”
E eu, que sou uma mulher prática (ou pelo menos me esforço), respondi: “sim.”
Sim, com pontinho final e tudo.
Porque o dia tava corrido, porque tinha prova no ateliê, criança com febre, e-mails acumulados, vestido novo sendo modelado, e eu honestamente não lembro nem se ela respondeu, se comprou… só lembro que fechei o computador e fui chorar no cantinho.
Não por causa da pergunta, que era ótima, legítima, objetiva. Mas porque ali, naquele “sim”, eu entendi que talvez eu esteja falhando gravemente em contar o tanto de coisa que existe por trás de um vestido da minha marca.
Porque sim, tem forro. Mas também tem:
- entretela no forro (entretela cara, da boa, daquela que se bobear é mais refinada que muito tecido por aí),
- o mesmo forro que os melhores ateliês do país usam — porque eu sou chique, mas exigente,
- bojo interno, moldado com carinho e cálculo,
- barbatana pra estrutura (e não é qualquer uma, é daquelas que seguram a alma no lugar junto com o decote),
- duas camadas de entretela no tecido principal, porque uma só não basta pra chegar naquele acabamento que parece alta-costura mas com etiqueta possível,
- zíper YKK — porque eu nunca tive coragem de usar outra marca, imagina o zíper estourar no meio da festa? O horror!,
- crinol na barra — pra quem não conhece, é um segredo de estrutura que faz o vestido existir mesmo quando você tá parada,
- e mais uns cinco ou seis truques que não dá nem tempo de listar, mas que a gente costura à mão, no silêncio, entre uma prova e outra, com uma pinça de precisão na mão e um olho na cliente que tá esperando lá fora.
E tudo isso eu queria ter dito pra ela.
Mas tudo que eu mandei foi: “sim.”
Então cá estou, tentando me redimir, escrevendo esse post pra dizer que os vestidos têm forro, sim. Mas têm também tempo, têm estudo, têm escolha, têm alma, têm engenharia têxtil, têm noites viradas e têm um nível de exigência que às vezes nem eu aguento.
E sabe por quê?
Porque o vestido não é só vestido.
É um manifesto costurado.
Agora, se você ainda quiser saber se tem forro, me pergunta de novo. Mas pergunta com tempo, que eu te conto tudo — com café, com afeto, e com todos os detalhes que esse “sim” não deu conta de entregar.